domingo, 28 de maio de 2017

Asleep

Short story by Brazilian author Diego Lops


Three o'clock in the morning and I sleep profoundly, after the vodka and the sex. I've had two dreams. I’ll only wake up at eight o'clock this Thursday, to the sound of the persistent alarm clock.

Next to me in bed, she, my beloved, leafs through the pages of a book she has taken from our home library. She looks away and turns to me serious, as if thinking of something puzzling I just said.

She turns off the table lamp. Little by little, her face, under the uneven light of the silent TV, is transformed. Her eyebrows point up and the corners of her mouth point down, her lips tightened. She cries for nine minutes.

She takes another sip of vodka. She goes to the bathroom to urinate. She looks at herself in the mirror. Goes back to bed. She turns up the volume of the television to disguise the irritating noise of my out of rhythm snoring.

She changes the channel. An angry televangelist. An old Woody Woodpecker cartoon. A clip of a band I liked in the 90s, but today I'm ashamed to listen in front of others. Another preacher, this one calmer. Without waking up, I grumble something she understands as a complaint, and lowers the volume.

She gets up again, goes to the kitchen. She opens the refrigerator and forgets her vacant gaze in the only light of the room. Ignoring the colors she gets the water bottle. She drinks a glass. Two, three, as if she wanted to drown some anguish. Goes back to our bed. She looks at my smooth face blued by the TV light. It’s a sales program showing a juice maker we will never buy.

She stares at me slowly, narrowing her eyes. Her expression goes from sadness to anger. She leaves the bed one more time. Sleeping naked, belly up, I remain motionless. She goes back to the kitchen. She opens a drawer and grabs a meat knife, which reflects her anguished dark eyes. Sitting on the edge of the bed, she removes the sheet and exposes my abdomen.

She wields the knife with both hands and rehearses the attacking gesture, standing still, and then backing away. The cold metal touches my throat. If I wake up now, what am I going to think?

She slides down the blade into the air, to the height of my softened yet still damp penis. My balls, exposed to the 17 degrees of air conditioning, seek a more comfortable position and rearrange spaces within the scrotum, which, wrinkling, shrinks. I dream my third dream, which I will never recall.

She looks at my face and wishes that I had a beard, that I had not been born, that she had not met me at that gym, that we had not made that trip to Buenos Aires three years ago, that she had not become pregnant with my child, she wishes she were not so jealous, that she had not bought that SUV that she has trouble parking.

She puts the knife in the drawer without cleaning it.







sexta-feira, 3 de junho de 2016

O novo Zé do Bêlo

Novidade no velho

É possível fazer algo novo recorrendo ao velho? Com o álbum A Moda Chegando Eu Vou Ver Como É, o gaúcho Zé do Bêlo prova que sim. Na obra, o cantor, compositor e violonista interpreta 12 canções compostas nas primeiras décadas do século XX que, apesar de terem feito estrondoso sucesso há quase cem anos, permaneciam desconhecidas até mesmo por pesquisadores, visto que o período reabilitado por Zé é pré-bossa nova. Muito mais do que um disco, o projeto é um trabalho minucioso de recuperação da história musical brasileira. “Não é justo que músicas tão boas fiquem soterradas no passado”, diz Zé do Bêlo. São canções como NicolauCasinha da Marambaia e Esquecer e Perdoar, de autores como Jararaca, Manezinho Araújo e João da Baiana, sucessos no seu tempo, que levam o ouvinte ao passado, oferecendo um gosto de nostalgia prazenteira do que não foi vivido.


Um Zé do Bêlo renovado?


Quem conheceu o Zé do Bêlo do início dos anos 2000 pode se surpreender com o repertório novo – que passa de composições próprias escrachadas para releituras sóbrias de músicas “de antigamente” – e até mesmo com sua sutil mudança de guarda-roupa: Zé continua ostentando o seu tradicional terno branco, mas agora bem cortado e não propositalmente amarrotado; o boné foi trocado por um chapéu coco; os tênis All Star surrados deram lugar a elegantes Oxford preto e branco. Também a voz agora está mais discreta e suave, lembrando pouco aquele personagem bastante peculiar que Zé costumava encarnar no palco. Essa mudança – adequada para seu novo repertório – também marca um novo rumo nas ambições da carreira do cantor. Atualmente radicado na capital da Paraíba, João Pessoa, Zé pretende expandir seu público-alvo, antes restrito ao underground porto-alegrense, e, quem sabe, conquistar o Brasil.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

Star Wars - precisamos falar sobre isso.

Assisti a O Retorno de Jedi no cinema e fiquei maravilhado. Nunca tinha me deparado com algo parecido em termos de ação, aventura e (cof, cof) efeitos  especiais. Torci por Luke Skywalker, temi Darth Vader, tive uma paixão platônica pela Princesa Lea (apenas a versão escrava sexy, claro), me emocionei com a pomposa trilha sonora e quis passar as férias na bucólica aldeia dos Ewoks. Gostei tanto que fui ao cinema mais outras cinco ou seis vezes para rever o filme. Apenas um detalhe: eu tinha 8 anos de idade.

Para as crianças, faixa etária para a qual a série foi destinada, Star Wars pode ser diversão e entretenimento fácil e inocente. E Star Wars realmente não é mais do que isso. Em matéria de narrativa cinematográfica, é competente, mas não traz nada de novo; seus diálogos são pobres e pouco criativos; as atuações, no geral, são forçadas e teatrais. Em suma, não há mística, nem profundidade, nem sabedoria nem metáforas inteligentes nos filmes, que não passam de entretenimento oco, exemplo básico de comercialismo superficial.


E não há nada de tão terrível em querer se divertir com esse tipo de filme. Pode até ser saudável, algumas vezes queremos mesmo dar uma folga para os neurônios. O grande problema começa quando os fãs adultos começam a levar tudo a sério demais, e passam a dar um valor excessivo a tudo que envolve os filmes da série, muitos ultrapassando o limite do patológico (como os fãs que ameaçaram de morte uma jornalista americana que debochou do filme). Há algo de patético em um uma multidão de seres humanos adultos que passam horas esperando na fila para ver um filme para crianças "antes de todo mundo". Poderia se dizer que esse verdadeiro comportamento de rebanho talvez seja reflexo do recente processo de infantilização que tomou conta do entretenimento comercial. Mas com a quantidade de dinheiro investida em publicidade para o novo filme - incluindo ridículas filmagens de reação de gente famosa assistindo ao trailer do filme (que você ingenuamente pensou que fossem espontâneas) e polemicas internéticas inventadas sobre racismo  em relação a atores do filme (que, mais uma vez, você inocentemente pensou se tratar de algo verdadeiro) - não é de se espantar que a massa tenha comprado tão facilmente a ideia de que o lançamento do novo filme seja algo relevante em qualquer sentido. Star Wars só não é o filme mais superestimado do planeta pois no topo dessa lista está Batman - O Cavaleiro das Trevas.

Mas digamos que eu esteja errado (afinal estudos comprovam que estamos errados, em média, 8 vezes por dia), e que o pensamento único concentrado em Star Wars seja apenas a celebração nostálgica e irreverente de sua infância (não se esqueça que Star Wars é feito para crianças), uma forma de reviver aqueles momentos, e por isso existe esse culto hoje em dia. Pode até ser, mas eu acharia no mínimo estranho ver adultos na rua brincando de amarelinha ou com uma chupeta na boca.





segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Coca-Cola na literatura

Stephen King é um defensor ferrenho da citação de nomes de produtos em obras literárias. Diz ele: 
"E eu acho que uma das coisas que eu tenho que fazer é dizer, é uma Pepsi, OK? Não é um refrigerante. É uma Pepsi. É uma coisa específica. Diga o que você quer dizer. Diga o que você vê. Faça uma fotografia, se você puder, para o leitor." Haruki Murakami é outro que se vale bastante de nomes de marcas em suas obras. Talvez, se os escritores mais antigos, como Dickens, Dostoiévski e Balzac, fossem menos tímidos em fazer comerciais incidentais, teríamos um retrato mais rico do espírito do seu tempo.
 
Assim, só por curiosidade, dou três exemplos de citação de Coca-Cola por autores consagrados.

Slogan criado por Fernando Pessoa para a Coca-Cola:


"Primeiro, estranha-se, depois entranha-se." 

No livro A vaca e o hipogrifo, de Mario Quintana, aparece:

"
Porque a coca-cola não é verdadeiramente uma bebida — concluiu ele —, a coca-cola é um estado de espírito…"

Nesta entrevista de Gabriel García Márquez para a revista Playboy, em 1983, ele revela algo surpreendente:

Uma cena memorável de Cem Anos é a do padre que levita quando bebe chocolate quente. Como é que você teve essa ideia?

Bem, havia um padre em Aracataca de quem se dizia que era tão santo que se elevava do chão quando levantava o cálice durante a missa. Quando escrevo sobre aquele episódio, ele não me pareceu acreditável. Ora, se eu não acreditar em algo, o leitor também não acreditará. De forma que decidi ver como ficaria com outros vasos e líquidos. Bem, ele começou a beber todo tipo de coisa, e nada funcionava. Finalmente fiz ele beber Coca-Cola, e me pareceu a bebida perfeita! Contudo, eu não queria fazer propaganda gratuita da Coca-Cola, de forma que dei ao padre chocolate quente, o que também pareceu acreditável. Se eu fosse adiante com a Coca-Cola, iríamos ver grandes outdoors na América Latina dizendo: SUBA AOS ARES COM COCA-COLA!

quinta-feira, 31 de julho de 2014

Pôsteres Poloneses (IV)

Aqui mais uma amostra do trabalho de artistas plásticos poloneses em cartazes de filmes americanos.
Coloco o pôster original para comparação.

De volta para o futuro




Os aventureiros do bairro proibido



O grande ditador


Viagem insólita




MASH



Os caçadores da arca perdida






Os intocáveis




Raízes da ambição



Três mulheres, três amores





Entre dois amores





A volta da pantera cor-de-rosa




Os profissionais


 Zorba o grego



Apertem os cintos, o piloto sumiu




Alice não mora mais aqui



Dirty dancing















quinta-feira, 22 de maio de 2014

Entradas e Bandeiras - Fernando Gabeira

Fernando Gabeira, depois que voltou do exílio na Europa, escreveu uma trilogia muito bacana, onde repensou o movimento guerrilheiro do qual fez parte e questionou o que seria dos seus participantes dali pra frente, em vista da abertura democrática do Brasil no inicio dos anos 1980, alem de revisitar a sua própria biografia. O primeiro foi o famoso O que é isso companheiro?, depois segui-se O crepúsculo do macho e por fim Entradas & Bandeiras. Deste último, tiramos dois trechos:


Nesses trilhos em que agora andamos juntos, queria encontrar Jerônimo. E explico por quê. Jerônimo era
motorista de um velho caminha Chevrolet que uma noite entrou pelo nosso quarto adentro. Ele perdeu a
direção na esquina da Vitorino Braga com Garibaldi;arrebentou a parede, deu marcha-ré e fugiu. Eu acabara de me masturbar pensando em minha avó. Os padres alemães da Igreja de São Sebastião me faziam rezar 20 ave-marias.

 --------------------------------------------------
O aeroporto ficava perto, relativamente. E no dia seguinte estava em Porto Alegre já quase no extremo sul.
Passo o primeiro dia em Porto Alegre concedendo entrevistas 'a imprensa. 
Uma das entrevistas concedi durante o almoço no restaurante macrobiótico da cidade. Era sobre o meu livro e atécnica do meu livro. Estava justamente tentando ampliá-la e refletir sobre a literatura e a vida. O repórter fumava e eu falava incessantemente. A mesa central do restaurante era destinada 'a direção da Sociedade Macrobiótica.
Havia um enorme cartaz indicando isto e os velhos nos olhavam com uma expressão severa. Um deles dirigiu-se a nós  e disse ao repórter que era proibido fumar e a mim que falava muito, enquanto comia. Reduzi o ritmo, mas foi difícil engolir aquela refeição macrobiótica, sentindo aqueles velhos olhando, atentamente, para meus lábios para ver se mastigava as 50 vezes necessárias. Tenho uma incrível capacidade de atrair patrulhas.

sexta-feira, 18 de abril de 2014

Entrevista de Playboy - Gabriel García Márquez

Trechos de entrevista de Gabriel García Márquez em1983

Cem anos de Solidão será transformado em filme, como se afirma?
Jamais. Os produtores me ofereceram enormes quantias pelos direitos, mas eu recuso. A última oferta, acredito, foi de 2 milhões de dólares. Não quero vê-lo transformado em filme porque quero que os leitores continuem imaginando os personagens da forma como eles os vêem, imaginam. Isso não é possível no cinema. No cinema a imagem é tão definitiva que o espectador não pode mais imaginar o personagem como deseja, mas sim como a imagem impõe.

Uma cena memorável de Cem Anos é a do padre que levita quando bebe chocolate quente. Como é que você teve essa ideia?

Bem, havia um padre em Aracataca de quem se dizia que era tão santo que se elevava do chão quando levantava o cálice durante a missa. Quando escrevo sobre aquele episódio, ele não me pareceu acreditável. Ora, se eu não acreditar em algo, o leitor também não acreditará. De forma que decidi ver como ficaria com outros vasos e líquidos. Bem, ele começou a beber todo tipo de coisa, e nada funcionava. Finalmente fiz ele beber Coca-Cola, e me pareceu a bebida perfeita! Contudo, eu não queria fazer propaganda gratuita da Coca-Cola, de forma que dei ao padre chocolate quente, o que também pareceu acreditável. Se eu fosse adiante com a Coca-Cola, iríamos ver grandes outdoors na América Latina dizendo: SUBA AOS ARES COM COCA-COLA!