No terceiro livro de Rafael Bán Jacobsen, Uma Leve Simetria (Não Editora, 2009) vemos alguns elementos do seu romance anterior (Solenar), como a delicadeza com quem trata temas tabus, o cuidado com a palavra, a presença de um personagem jovem e bastante amadurecido, o questionamento existencial. Ainda assim, essas semelhanças, que poderiam parecer um esgotamento de recursos, somente evidenciam a consolidação de um estilo característico do escritor.
Uma Leve Simetria mostra, pelos olhos de um narrador em primeira pessoa, os conflitos de um amor proibido. E contar mais talvez seja contar demais.
Trecho do livro:
“A negativa veio com firmeza: não.
Quero te pedir uma coisa, Daniel: não comentes sobre isso com ninguém.
Permaneci calado. Nesse pedido, o golpe final: sim, o que eu sentia era proibido; sim, as palavras, os carinhos, a ânsia, tudo tinha de ser amortalhado no silêncio. Sem resposta, o rabino insistiu: prometes para mim?
No lugar da promessa, uma indagação: por que não posso gostar dele?
Não me perguntes isso, Daniel, por favor.
Tudo poderia ter acabado nesse instante: a conversa, com um assentimento; minha história com Pedro, com uma automutilação; meus devaneios e desespero, com o tempo – da eternidade. Mas o que o rabino Levi disse, a seguir, aniquilou o pouco de mim que ainda lutava: se olharmos friamente para a Lei, nada impede o gostar; contudo, a realização é vedada. Entendes, Daniel?
Sim, eu entendia. O mandamento era ainda mais cruel do que parecia a princípio, um cântico terrível que, em vez de trazer paz e alento, inflamava conflitos. Eu poderia viver para sempre querendo pedro, buscando, no ventre solitário das madrugadas, sua imagem para me acalentar; nunca, porém, a vontade divina se alegraria caso fosse concedida a mim a graça de traduzir o delírio em toques ou palavras sopradas ao ouvido dele, prenunciando o mais sublime enlevo. Nessa hora, então, o sangue derramado sobre nossas cabeças.”
O que já disseram:
Moacyr Scliar, imortal:
“Uma leve simetria revela-se uma grata surpresa. Com grande sensibilidade e não menor talento literário, Rafael Bán Jacobsen narra-nos uma história que, tendo como moldura a vida comunitária judaica com seus costumes e suas tradições, representa, contudo, um verdadeiro mergulho na condição humana – uma obra que, desde já, consagra o seu autor como um importante nome na nova geração de escritores brasileiros.”
Léa Masina:
“Não se trata de mais uma história judaica, do tipo que se enquadra num regionalismo étnico e urbano. Muito embora os usos e costumes formem o substrato concreto dessa narrativa – e são muitas as expressões que remetem a essas particularidades culturais e a contextualizam –, o que interessa ao leitor é o desenvolvimento dos conflitos e das relações humanas; em especial, o desenrolar da história de amor entre dois adolescentes, que alcança momentos sublimes, sem jamais resvalar nesse terreno perigoso, onde a caricatura e o maniqueísmo são ameaças constantes.”
Carlos André Moreira, jornalista:
“Uma Leve Simetria trata de um tema antigo como o mundo: o embate entre aspirações de uma fé religiosa pura e o desejo proibido da carne. O que Jacobsen faz em sua narrativa é inverter o foco, ao apresentar esse tema aplicado a uma atração proibida entre dois rapazes. Um tema que o livro também proclama antigo como o mundo.”
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