quinta-feira, 22 de maio de 2014

Entradas e Bandeiras - Fernando Gabeira

Fernando Gabeira, depois que voltou do exílio na Europa, escreveu uma trilogia muito bacana, onde repensou o movimento guerrilheiro do qual fez parte e questionou o que seria dos seus participantes dali pra frente, em vista da abertura democrática do Brasil no inicio dos anos 1980, alem de revisitar a sua própria biografia. O primeiro foi o famoso O que é isso companheiro?, depois segui-se O crepúsculo do macho e por fim Entradas & Bandeiras. Deste último, tiramos dois trechos:


Nesses trilhos em que agora andamos juntos, queria encontrar Jerônimo. E explico por quê. Jerônimo era
motorista de um velho caminha Chevrolet que uma noite entrou pelo nosso quarto adentro. Ele perdeu a
direção na esquina da Vitorino Braga com Garibaldi;arrebentou a parede, deu marcha-ré e fugiu. Eu acabara de me masturbar pensando em minha avó. Os padres alemães da Igreja de São Sebastião me faziam rezar 20 ave-marias.

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O aeroporto ficava perto, relativamente. E no dia seguinte estava em Porto Alegre já quase no extremo sul.
Passo o primeiro dia em Porto Alegre concedendo entrevistas 'a imprensa. 
Uma das entrevistas concedi durante o almoço no restaurante macrobiótico da cidade. Era sobre o meu livro e atécnica do meu livro. Estava justamente tentando ampliá-la e refletir sobre a literatura e a vida. O repórter fumava e eu falava incessantemente. A mesa central do restaurante era destinada 'a direção da Sociedade Macrobiótica.
Havia um enorme cartaz indicando isto e os velhos nos olhavam com uma expressão severa. Um deles dirigiu-se a nós  e disse ao repórter que era proibido fumar e a mim que falava muito, enquanto comia. Reduzi o ritmo, mas foi difícil engolir aquela refeição macrobiótica, sentindo aqueles velhos olhando, atentamente, para meus lábios para ver se mastigava as 50 vezes necessárias. Tenho uma incrível capacidade de atrair patrulhas.